EXPLICAÇÃO DO FIM DA SÉRIE FAMÍLIA SOPRANOS


Na verdade, entenda o fim e a profundidade da série toda rs.



Depois de ver um vídeo no YouTube sobre o fim da série, fiz um comentário com basicamente 70% de conteúdo retirado de sites em inglês que debatem/explicam o fim e a série. Então vi que poucas pessoas entenderam realmente The Sopranos, daí resolvi postar o comentário aqui e ajeitar melhor a explicação.  As palavras em laranja são links para imagens ou para outras páginas. Aí vai: 

Ob: SE VOCÊ AINDA NÃO VIU A SÉRIE, NÃO LEIA.



Você provavelmente nunca ouve quando acontece, certo?


Penso que um dos motivos pelo qual David Chase (o criador da série) decidiu não mostrar Tony assassinado foi porque ele queria que o espectador revisasse a série com mais atenção, querendo dizer "tem algo mais do que vocês viram aí, vejam de novo e prestem mais atenção".


Nos "sonhos" de Tony, Blundetto/Man (como aparece nos créditos) diz, ao ser perguntado se Kevin Finnerty está na casa: "Nós não falamos assim aqui" (ou seja, os nomes não importam na viagem de coma de Tony).

Os monges tentam fazer com que Tony assuma sua responsabilidade (sobre suas maldades). Eles dizem para Tony-Finnerty que o seu "processo prossegue", porque Tony não quer assumir a responsabilidade sobre seus maus atos. Tony-Finnerty prevê corretamente que "o processo pode causar problemas mais tarde". Ele disse, em coma, que o Alzheimer "é uma sentença de morte". O Alzheimer é a perda de memória; Tony esqueceu o que é realmente importante: sua família verdadeira. Ele tinha que ver isso com seu médico quando voltasse para casa --> com a doutora Melfi.

Um pregador que visita Tony no hospital diz que a salvação não é apenas sobre salvar-se após a morte, mas "sobre como salvar a si mesmo quando você está vivo". Se ele não mudasse, iria morrer.





Quem dá o recado para ele assumir seus erros são os budistas -> aqueles que falam sempre da morte, da finitude, que acreditam na lei do karma; dizem que cedo ou tarde você vai receber de volta tudo o que fez.
o processo seria o fim pelas "vias legais", pelo testemunho de Carlo contra ele;
o Alzheimer é "a sentença de morte", o fim pela morte de fato.


Essa era a função da Melfi em toda série, fazer ele despertar moralmente, "endireitá-lo".

Veja esse diálogo da 4° temporada (ep. 11), quando Tony diz que vai sair da terapia:

Melfi: Depois de suprirmos a necessidade de alimento e abrigo...resolvemos prestar atenção em outras fontes de sofrimento e verdade.

Tony: sofrimento e verdade... Qual é ?! Sou um pilantra gordo de Nova Jersey!

Melfi: Agora que os ataques de pânico e a depressão foram tratados, podemos trabalhar de verdade. Quando pararmos de apagar incêndios vamos investigar quem você é... e o que você quer nesta sua breve passagem pela Terra.



Após o coma, inicialmente ele até tentou ser bom. Por exemplo, perdoou o enfermeiro que roubou sua carteira, aceitou um acordo com o Phil e arrumou confusão com seus homens para dar uma segunda chance para Vito (quando descobriram que ele era gay).



Mas Tony estava inserido em um meio corrupto e foi questão de tempo para voltar a seus velhos hábitos.

Na Temporada 6B (a partir de S06E13), Tony se torna mais cruel e mais longe de seu despertar espiritual (que teve com o coma). Ele faz Bacala cometer seu primeiro assassinato por vingança (por Bobby ter batido nele na casa do lago), considerou seriamente matar Paulie, destruiu sua amizade com Hesh e também prejudicou a sobriedade de Christopher.

Ele teve uma nova chance para consertar os erros após ser baleado, mas ficou claro que ele nunca iria mudar. Ele não levou a sério o que ele mesmo repetia depois do coma: "após isso, cada dia é um presente".

Seu êxtase no nascer do sol, em Vegas, "I get it"... na verdade ele não entendeu nada. Essa compreensão dele foi de que "ah, não existem regras ou um sentido na vida, eu fiz a maior maldade de todas - matar Cris - e a sorte no jogo mudou". É como aquele paciente que melhora no hospital, tem alta, vai para casa e morre.


Ob: Phil Leotardo também teve um infarto, não ouviu o conselho de Tony para "focar nos netos", também ficou mais maldoso (p ex, aumentou as taxas para que Tony continuasse a despejar amianto em sua área; além de matar Vito) e também morreu.

Durante a viagem de coma de Tony, Blundetto disse a ele "Você está indo para casa". Ficou claramente simbolizado que o "Inn at the Oaks" seria sua morte, tanto que ele acordou do coma antes de entrar. No episódio "Chasing It", Nancy Sinatra pergunta a Tony e Phil "Vocês dois estão indo para casa juntos?"


A morte dos dois acontece enquanto eles estão felizes, distraído por suas famílias (Phil pelos bebês, Tony por Meadow caminhando através da porta). O compromisso dos 2 chefões com suas famílias mafiosas (que tem prioridade, como pode ser visto no juramento de Cris na 2° temporada), o compromisso com poder e riqueza separou-os permanentemente do que era mais importante para eles, suas verdadeiras famílias.



Ob: como Tony e Phil, Johnny Sack também morre na frente de sua família de três (esposa e duas filhas) no hospital da prisão. O guarda de segurança da prisão diz para Johnny que ele não pode abraçar sua família ("nenhum contato físico, por favor"). Como ocorreu com os outros dois, a vida na máfia dele também o afastou de quem ele realmente amava. [obs: e tudo isso por dinheiro...o crime compensou para eles?]

Há muito simbolismo em TUDO que tem destaque, seja na tomada de câmera ou na fala de um personagem.


 "...of the fact that there are only two ways out for a boss: dead or in jail"

"...de fato, existem apenas duas maneiras de um chefe acabar: morto ou na cadeia."


Tony e  Phil Leotardo -> MORTOS (assassinados)

Johnny Sack -> CADEIA


Em Vegas, Tony ri da sua sorte no jogo, que mudou para melhor, o que ele acredita ser resultado da morte de Christopher. Essa constatação resulta em Tony caindo no chão do casino rindo histericamente . Ele chega à conclusão de que a bola de roleta funciona com "o mesmo princípio que o sistema solar", isso ilustra a crença de Tony que a vida é simplesmente um jogo de azar, acaso, sem regras morais. Tony já não acredita em qualquer coisa, porque a sua sorte só fica melhor depois do assassinato desprezível de Christopher.

Perto do final, Tony explica a Paulie que a sua sorte no jogo mudou desde Christopher morreu. Na mesma conversa, Tony ri da revelação pessoal de Paulie (sobre ter visto a Virgem Maria), ao hesitar  assumir o posto do esquema de construção em NY, dado que todos que estiveram ali sofreram morte prematura. Tony responde "Eu não estou dizendo que não há nada lá fora, mas não viver sua vida?" Tony conversa com Melfi a respeito de  sua experiência com peyote em Vegas, diz que talvez existam universos paralelos... ele realmente não entendeu!

Ob: Há dois eventos místicos/extraordinários com Paulie (além do episódio do médium, que será abordado mais tarde): ele viu a Virgem Maria (acordado) e Pussy (num sonho). Após ver a santa no Bing, ele fez as pazes com sua mãe (de criação). No sonho, Pussy estava cozinhando para ele em sua casa, isto é, Pussy (morto) estava esperando Paulie, o que este entendeu imediatamente que algo de ruim poderia lhe acontecer - vide sua fala (perguntou se ele continuaria de pé quando sua hora chegasse).

Paulie foi o único que deu um passo atrás (após superar um câncer de próstata descoberto no início) e que parecia ver o quadro geral, dado que alterou seu comportamento por sinais/sonhos... e foi o único membro original da gangue de Tony que não terminou em má situação (Silvio em coma, baleado; Pussy, Chris e Tony assassinados).

Repare que há um pano de fundo espirituoso/místico em toda a série. Como quando Tony vê Pussy no espelho. Veja, Tony estava acordado e isso não aconteceu outras vezes (Tony ver pessoas mortas), o que dá certa credibilidade de que não foi acaso ou algo tolo, que estava ali sem motivo.


Silvio não ouviu os tiros até que ele já estava coberto de sangue -> por isso não escutamos o tiro em Tony (veja que as pistas foram sendo dadas...). Tudo o que vai acontecer no restaurante foi indicado nos episódios anteriores, (como no final de The Blue Comet, 6x20) e desde o início da série (veja) (e, posteriormente, por David Chase em entrevistas).



Chase conecta simbolicamente as duas viagens de Tony (a viagem para conferência quando ele estava em coma e sua viagem real para Vegas). Durante o coma, foi-lhe dito para seguir o farol de luz no horizonte para encontrar o "Inn at the Oaks" (ou seja, o farol vai levar Tony à MORTE). Pouco antes da viagem de Las Vegas, Tony sufoca Chris e quando ele olha para a estrada vê um farol de um veículo que passava. Ele estava seguindo caminho rumo a morte.





A viagem para Costa Mesa de Tony foi a chance dele fazer sua  regeneração moral. A viagem para Vegas foi sua deterioração completa e simboliza o fim de sua segunda chance, revela que ele rejeitou completamente a sua experiência de coma e sua breve percepção anterior de que ele era “parte de algo maior” e estava “sendo levado por um vento forte”.


Tony falhou em não conseguir mudar. Ao longo da série, Melfi lhe deu insights para ele se tornar uma pessoa melhor, até tentou algumas vezes conscientizá-lo do mal que fazia às pessoas, enfim, tentava "DESPERTAR/ACORDAR" Tony, mas sem sucesso. No fim, Tony não agarrou sua última chance,  ele nunca iria despertar moralmente. Ele inclusive acaba debochando de sua experiência: "Todo dia é um presente, mas tem que ser um par de meias?".


Durante a viagem de coma, Tony muda acidentalmente as pastas com um homem chamado Kevin Finnerty, que nunca vemos. A carteira de motorista de Finnerty revela que ele tem a mesma idade de Tony e tem uma grande semelhança física (tanto que os monges tem certeza de que Finnerty é Tony). O fato de Tony ser um vendedor de "lentes de precisão" no "sonho" sugere que este Tony pode ser capaz de ver as coisas com mais clareza. A viagem dele a Costa Mesa se torna uma busca por sua verdadeira identidade: Tony-Finnerty é um vendedor educado e pai amoroso ou um charlatão corrupto que defrauda os inocentes? Quando o episódio se aproxima de sua conclusão, Tony questiona se ele realmente é Kevin Finnerty e chega mais perto de uma contabilidade moral de suas ações.

A viagem em coma torna-se a viagem psicológica que Tony nunca teve a coragem de fazer completamente com a Dr. Melfi. A esposa de Tony/Finnerty diz, via telefone, que ele "não queria ir a esta conferência". Ele então diz a sua esposa que sente falta dela e dos filhos, mas ela responde que é culpa dele porque ele está "muito distraído com o trabalho" e está "fora em seu próprio mundo"; Isso indica novamente que a lealdade de Tony com sua outra "Família" (a máfia) o distraiu do que é realmente importante: sua família real.

A pergunta aparente na última temporada (se Tony pode mudar) está intrinsecamente ligada ao amor de sua família e ao amor de seu estilo de vida criminoso; as duas coisas que ele tentou reconciliar desde o episódio de abertura. A nova atitude de Tony está diretamente relacionada ao amor de sua família, especialmente seus filhos, que realmente foi a única vez que o espectador simpatizou com Tony em qualquer nível moral. Depois que ele sai do hospital, ele diz a Carmela que ela é a razão pela qual ele sobreviveu ("É tudo você"). Carmela, Meadow e AJ estavam constantemente perto da cabeceira do hospital de Tony e foi a voz de Meadow que despertou Tony do coma. Além disso, Carmela dá a Tony seu novo cartão de seguro nos primeiros momentos de "Members Only". Mais tarde, nós sabemos (pelo representante da companhia de seguros de Tony) que ele teria morrido se ele não tivesse o cartão (pois ele teria sido levado para o hospital do condado, inferior, onde ele certamente teria morrido em decorrência dos seus graves ferimentos; o Dr. Plepler confirma mais tarde o mesmo para Carmela). A família de Tony está diretamente ligada à sua sobrevivência e à sua segunda chance.


No primeiro episódio Tony passa mal após a família de patos deixar sua piscina. Tony chora para Melfi porque ele tem medo de  perder a sua família. No fim, os patos nunca mais poderão voltar, pois Tony drena a piscina. Ele iria perder sua família.



Em vez da família salvar Tony, ele é que acaba corrompendo ela.... Durante toda série Tony afirma que faz o que faz para cuidar de sua família e tenta manter uma lar americano relativamente normal. Ele sempre disse que não queria ver seu filho metido na máfia, que queria ver sua filha independente, uma doutora Soprano - médica. A relação dele com sua esposa sempre foi centrada na boa criação dos filhos... e no fim, A.J. acaba em um emprego arranjado na produtora de filmes pornôs de Little Carmine (com tudo que envolve esse meio -  como já vimos através da experiência de Christopher), Meadow, que com o tempo foi cada vez mais se tornando uma defensora de seu pai (transformando-o numa vítima do Estado, passando a idealizar os ítalo-americanos, bem como os imigrantes pobres em geral), além de aos poucos ir fechando os olhos para o lado negro do modo de vida dele (como com a desculpa de nunca ter presenciado violência em sua infância) termina como defensora de bandidos endinheirados (um deputado corrupto envolvido com prostituição e drogas). E Carmela, que inicialmente apoiava a terapia de Tony, que sempre tentou ser uma boa influência para ele, apesar dos "carinhos" que sempre aceitou - mesmo sabendo de onde vinha os presentes/dinheiro, ela sempre teve culpa por isso e buscava redenção sendo uma boa católica e fazendo de Tony um homem melhor - acabou fazendo um acordo tácito com ele (após o divórcio), no qual Tony podia ter a vida sexual que quisesse, desde que bem longe de sua família e de modo discreto. Carmela não tinha mais esperança que Tony iria mudar e praticamente já estava preparada para levar sua vida após a morte dele (estava envolvida em projetos de construção de casas).

Isso é evidenciado na última cena de Carmela em casa, enquanto vemos na TV o presidente Bush dançando espalhafatosamente com africanos e, após o diálogo abaixo, vemos Carmela estudando um folheto de cozinhas planejadas. No diálogo, simbolicamente fica claro que ela colocou seus interesses na frente de seus filhos/família.

Carmela - Escuta... não vamos jantar em casa. Podíamos ir ao Holsten's.
A.J. - Você disse que comeríamos Manigott.
Carmela - Tenho de me encontrar com os carpinteiros.

Little Carmine disse para Tony que "Houve um tempo em que eu era obcecado por estar no comando". Ele fala sobre seu ritual com sua esposa onde ele chega em casa do trabalho e ambos saltam nus juntos em sua piscina (a piscina refletindo família, assim como piscina de patos de Tony). Carmine explica que durante a sua luta com John sua esposa lhe disse que não "quer ser a viúva rica em Long Island, eu quero você". Little Carmine explica que a "caixa vazia não é sobre ser chefe, é sobre ser feliz" e ele deve "encher a caixa." Carmela será  a "viúva rica" ​​em Nova Jersey. Ela não fazia mais questão nenhuma de afastar Tony do perigo, no fim ela ficou preocupada mesmo é em como ele se sustentaria quando Tony morresse - ela já esperava isso, era questão de tempo -, se tranquilizando quando finalmente convenceu Tony a fechar o seguro de vida com seu primo Brian.


Outro fato a se notar é que entre os chefes da série (Tony, Carmine, Johnny Sack, Phil, Rusty), vemos claramente que o mais tolo, despreparado e prepotente é Little Carmine e justamente ele tem a sacada (através de um sonho e a pedidos de sua esposa/família) de se afastar do poder. E dessa forma ele não termina morto e pode continuar a desfrutar da vida e de sua família.



O título do primeiro episódio (6x01) refere-se a Eugene Pontecorvo que usa uma "Members Only®" (essas jaquetas não trazem o logo da marca, mas são facilmente identificáveis, veja no google), tradicional marca de jaquetas e que vários mafiosos usam ao longo da série (como Richie Aprile e Feech LaManna). No episódio, Vito tira sarro de Eugene por ele sempre usar isso. Perto do final, Eugene comete suicídio depois de saber que Tony não vai deixa-lo se aposentar.

Varias pistas neste episódio prenunciam a morte de Tony. No episódio, Eugene comete suicídio por causa dele, imediatamente depois disso, Tony é baleado; as camisas usadas por Tony quando ele é baleado em ambos os episódios têm padrões similares; a câmera no rosto de Tony deitado abre o episódio final, e a imagem final de Members Only (6x01) são quase idêntica, com Tony lentamente perdendo a consciência.





Repare na imagem acima à esquerda (que abre o último episódio): Prenuncia TONY EM UM CAIXÃO. E o som do rádio ao ligar (como despertador) toca um órgão de velório, antes de o radialista entrar. Esse órgão faz parte da música, mas foi escolhida de propósito (You Keep Me Hanging On, Vanilla Fudge), repare.

A última temporada começa com o episódio intitulado "Members Only" e termina com o personagem creditado como "Man in Member Only jacket" matando Tony.  

A morte de Tony por "Man in Members Only Jacket" é a consequência final das ações dele. Representa não só o passado de máfia de Tony voltando para destruí-lo, mas também simboliza as vidas que ele destruiu, como o que ele fez a Eugene -> o homem que usa Members Only.

Note: Eugene, usando uma jaqueta MO, atirou num homem gordo chamado Teddy Spiradokis (iniciais TS = Tony Soprano) sentado em um restaurante. No mesmo episódio, a esposa dele, com raiva que Tony não vai deixa-los ir para Florida, ameaçadoramente diz para ele "colocar uma bala na porra da cabeça dele (Tony)"....




Essa ligação com Eugene é interessante. Só o que importava para os mafiosos era dinheiro, tudo tinha um preço (p ex, Butch iria ter que pagar a Janice pela morte do marido dela) e Eugene sabia disso, por isso pagou uma bela quantia da herança que recebeu à Tony (para "comprar" sua aposentadoria, caso contrário muito provavelmente ele não iria informar Tony sobre isso). E Tony não só negou o pedido como ainda o explorou, fazendo ele cometer um assassinato. E como Eugene reagiu? Ele se voltou contra Tony? Seja atentando contra sua vida ou colocando ele em uma fita para o FBI? Não, ele tirou a própria vida, o que, na lógica budista em que a série está inserida, deve ter gerado um agravo de karma negativo muito grande para Tony.



Na cena final,  Meadow corre para a porta do restaurante com um olhar ansioso no rosto que pode indicar que ela tem uma grande notícia (estava grávida) para contar para o pai (daí o nervosismo para estacionar). No episódio final, enquanto visita Silvio no hospital, Tony olha para a TV e vê uma cena peculiar do filme "Pequena Miss Sunshine", um grito estridente da garotinha... isso pode nos antecipar a reação de Meadow no restaurante...



Enquanto Meadow corre para o restaurante, um veículo familiar (SUV) passa na rua... ou eu diria que está indo embora...


Ainda há uma homenagem a The Godfather (O Poderoso Chefão). Uma das principais cenas é o assassinato que Michael Corleone faz no restaurante para vingar o atentado a seu pai (cena preferida de Tony, comentada por ele e AJ, qndo este tentou matar Junior para se vingar). Uma das vítimas na cena do Godfather (Sollozzo) diz pouco antes de seu assassinato que o restaurante tem "a melhor carne bovina da cidade". Pouco antes de seu assassinato (também feita por um filho para se vingar da morte do pai, Phil - repare na semelhança facial deles, e na cabeleira peculiar) Tony diz a Carmela e AJ que os anéis de cebola são "os melhores do estado".



O assassino está com medo de Tony reconhecê-lo (ou, no mínimo, de reconhecê-lo como uma ameaça), repare que ele não faz contato visual com Tony em nenhum momento, ele também se levanta de cabeça baixa (como quem não quer nada) e VIRA O ROSTO antes de fazer a curva para ir ao banheiro, ficando com o corpo meio desengonçado, demonstrando seu receio de Tony reconhecê-lo (o espectador nunca o viu). Provavelmente ele estava seguindo AJ e entrou antes para não chamar a atenção de Tony, pois este se concentraria no seu filho.



Outra teoria diz que o homem simboliza o pai de Tony, isto é, o fato de T nunca ter conseguido avançar na discussão com Melfi sobre o mal que seu pai lhe causou (o iniciando na vida do crime), pelo mesmo motivo ele se recusava a discutir o tiro sofrido pelo tio Junior. Argumentam que Tony amava seu filho, por isso ele fez de tudo (no início) para afastar AJ da vida criminosa, diferente do que seu pai fez com ele (no fim ele acaba querendo entrosar AJ com filhos de mafiosos*...será que ele não sabia que AJ seria exposto a violência andando com eles?). E dizem ter certa semelhança entre o atirador e o pai de T.

* os Jasons: o filho mais novo de Patsy, Jason Parisi e um filho de Carlo, Jason Gervasi.

Mas, veja bem. Pare para pensar: por que um cara mataria Tony NA FRENTE DE SUA FAMÍLIA em um local público, bem no meio de um restaurante? Ele poderia matá-lo de diversas outras formas mais discretas. O assassino fez questão de que Tony morresse na frente de sua família (como Phil) POR VINGANÇA. E como Phil, ele nem ouviu o tiro.

Em raríssimos momentos nos foi mostrado algo a respeito dos filhos. Na 5° temporada (ep11, The Test Dream), durante o sonho de T, Phil diz que não podia morrer pois "eu tenho filhos, eles têm filhos", podendo significar que, em caso de sua morte, o assunto não acabaria aí, pois ele não é só mais um cara, ele "continua em seus filhos". Sabemos que a família fica de fora dos "negócios", não soa estranho nunca termos visto o filho de um personagem tão importante como Phil, eles nunca foram o foco (a não ser os filhos de Tony). Na 6B (ep19) Coco pergunta para Meadow se ela era mesmo a filha de Tony. Sobre os filhos de Phil, não há nada, diferente de filhos de  outros personagens (como Johnny Sack), que vez por outra ouvimos alguns comentários de como estão (seria proposital a omissão?)


No início do episódio final, Tony aparece descascando uma laranja (única vez na série), numa óbvia referência ao Poderoso Chefão, onde as laranjas estão intimamente associadas com uma morte/atentado que se aproxima.


Lá atrás, quando um homem tentou matá-lo, ele estava segurando seu suco preferido, de laranja (que ele bebe várias vezes ao longo da série e pode simbolizar sua situação de constante rico).


Anteriormente laranjas já tinham sido associadas à morte com Ralph, mas note que a morte desse não ocorreu imediatamente (como se passará com Tony). Ao longo da série não vemos mais laranjas.






O gato alaranjado é Adriana. Ela costumava usar jaquetas com estampa de leopardo, a última imagem dela é ela rastejando no chão (como um gato) tentando escapar de Silvio. E ele também iria trazer desgraça, como Paulie percebeu. Ele diz para Tony que acredita que o gato é um mau presságio. O gato laranja se transforma em pintura de um grande tigre sobre o ombro direito de Tony no restaurante.


Cris e e Adriana são representados na cena final simbolicamente. O jogador de futebol americano representa Cris (compare a imagem desse jogador com a que penduraram dele no escritório e veja a semelhança). A imagem do meio remete-nos ao coma, ao "Inn at the Oaks", a volta para casa, a morte.




É Tony quem escolhe a música no jukebox. Don't Stop Believin' (Não pare de acreditar) é sua fantasia, ao longo da série ele nunca deixou de acreditar que ele podia conciliar a sua vida familiar com a vida na máfia. A música para e o corte abrupto da tela quer dizer: isso não pode mais "continuar e continuar", acabou.

Paralelo com a morte de Phil: Dois negros entram no restaurante pouco antes de Tony ser baleado, primeiramente, note que Tony não os viu, o que desmente a teoria que ele está paranoico - ele está no centro do restaurante, ao lado da jukebox, tranquilo o tanto que seu instinto mafioso o deixa estar. Mais cedo, um grupo de jovens negros testemunhou a cabeça de Phil ser esmagada por seu SUV, esses vão ver a cabeça do Tony jorrar sangue.




Há uma série de referências ao assassinato de Abraham Lincoln. Lincoln foi baleado na cabeça na frente de sua esposa por um atirador solitário depois de ter vencido a Guerra Civil. Tony Soprano era o líder de uma família da máfia. Ele foi baleado na cabeça na frente de sua família por um atirador solitário depois que ele ganhou a guerra da máfia NY / NJ. Lincoln foi famosamente assassinado no Teatro Ford e no episódio final, Chase dá várias fotos em close-up do logotipo "Ford" quando o SUV rola sobre a cabeça de Phil. Tony assiste a um documentário Lincoln no final da 6a ("Kaisha") sobre a depressão de Lincoln (que por sua vez reflete a depressão dele). Carmela faz para AJ sanduíches "Lincoln Log". Mais tarde no episódio, AJ é visto no hospital assistindo a um comercial de TV de um comprimido para dormir em que vemos um ator retratando Abraham Lincoln. No penúltimo episódio ("The Blue Comet") Tony oferece a Janice uma nota de cinco dólares, a nota é mostrada em  close-up e o rosto de Lincoln é visto.




Perceba que a raposa velha do Paulie muitíssimo provavelmente estava fechado com Butch para liquidar Tony (POR ISSO Butch disse "Não" ao assassinato de Paulie). E Patsi também.

 

Isso que a morte é escuridão, "um grande nada" foi dito por Lívia, uma mulher totalmente infeliz, rabugenta e ignorante. No episódio com o médium, na 2° temporada (ep.09), DC passou sua mensagem - a morte não é o fim. A genialidade de Chase usou Paulie e fez da ocasião um episódio cômico (satanic black magic!), que passaria despercebido para o grande público. O mesmo no final com a Virgem Maria. A mensagem é "a morte não é o fim", daí o uso de um médium, da Virgem, da espiritualidade egípcia* e dos monges budistas (e, mais anteriormente, também foi abordado o Judaísmo), todos tentam dar respostas, envolvem teorias cheias de groselhas, mas no fundo dizem a mesma coisa: a morte não é o fim, seja um bom menino.


* através da abertura da 6° temporada, com a musicalização do trecho Seven Souls do livro "The Western Lands" de William S. Burroughs pelo grupo Material.



 "Tudo o que há realmente é o amor. Isso é tudo que realmente importa, o resto não tem nenhum valor" David Chase discutindo The Sopranos em uma entrevista em 04 de outubro de 2005.

 Como Cris repetiu diversas vezes: "Esse é o cara (Tony) por quem eu vou para o inferno".

O melhor conteúdo audiovisual de todos os tempos.

OBRIGADO DAVID CHASE !!!





A melhor tirada da série (2º temporada, ep. 09): do Além, Mikey Palmice (motorista e guarda-costas de Junior que fora assassinado por Christopher e Paulie no fim da primeira temporada) trolla o médium e manda ele perguntar a Paulie se a 'urtiga' (poison ivy) "ainda coça" (em referência a seus últimos instantes de vida, quando Paulie foi infectado em sua perseguição).













Acréscimo:

- para quem acha que Chase disse que Tony não morreu:

isso foi um mal entendido de 2014. Provavelmente Chase foi irônico por não suportar mais ser perguntado se Tony morreu ou não...o fato é que, diante da repercussão da "notícia" que Tony não estava morto, ele soltou uma nota dizendo que foi mal interpretado.

"Um jornalista da Vox interpretou mal o que David Chase disse em sua entrevista. Citar ele simplesmente dizendo "Tony Soprano não está morto" é impreciso. Há um contexto muito maior para essa afirmação e, como tal, não é verdade. Como David Chase disse várias vezes na gravação, "Se Tony Soprano está vivo ou morto não é o ponto." Continuar a procurar esta resposta é infrutífero. A cena final de The Sopranos levanta uma pergunta espiritual que não tem resposta certa ou errada."



Ainda em 2014, Chase, em uma entrevista para o The Daily Beast, novamente enfatizou o significado do final e quase explicitamente afirma que Tony morreu. Ele afirma que a cena final faz uma "pergunta espiritual" e é então perguntado qual é a pergunta espiritual:

[Pausa longa] Eu direi isto: A pergunta [espiritual] que a cena final pede é, para ser realmente pretensioso, o que é o tempo? Como passamos nossa estada realmente breve aqui? Como nos comportamos e o que fazemos? E o reconhecimento de que tudo acabou muito cedo, e raramente acontece da maneira que pensamos. Eu acho que a morte raramente vem para as pessoas da maneira que eles pensam que vai acontecer. E a pergunta espiritual seria: "É tudo o que existe?"






Especiais


(S03E13) Exército de um só homem
(S04E06) Everbody Hurts
(S06E21) "Made in America" e o Terrorismo
(S06E01) Sete Almas - Abertura da Última Temporada 
(S03E11) Pine Barrens
(S04E01) O início do fim:  For All Debts Public and Private
(S03E08) Segunda Opinião
(S06E13) Soprano Home Movies
(S04E09) Quem fez isso? [+ a teoria que Artie foi quem incendiou o estábulo]
(S02E07) D-Girl   ["Deus está morto", "a vida é um absurdo" - Uma Análise Psicológica e Filosófica em The Sopranos]



Sopranos, a maior série de todos os tempos
Trilha Sonora / Soundtrack Família Soprano
Entrevistas de David Chase 
Sopranos é Vida
Outros simbolismos no final e Mais
Carmela Soprano
A Pintura de Tony com Pie-O-My
Ralph Cifaretto e o Diabo




Se vc não acessou os links e não viu ainda, veja também:

Breve Retrospectiva
Motivos de Patsy para querer Tony morto e mais 
Menção a Banheiro Masculino nos episódios finais







25 comentários:

  1. mt bom li tudo
    faça mais artigos sobre Sopranos (análise de personagens, temporadas) é raro encontrar conteúdo br sobre Sopranos

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  2. De extrema qualidade essa postagem... Parabéns! The Sopranos é minha série favorita, ganha de breaking bad.
    Muitas referencias, boas musicas, série foda! Muito bom o post tambem

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  3. Show de bola realmente. Comecei assistir só para passar o tempo, mas acabei viciando na série. Longas semanas assistindo aos 86 episódios e, para falar a verdade, havia ficado um pouco decepcionado com o final. Mas, após aprofundar o tema neste post, digo que o final foi excepcional. Parabéns.

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  4. Fantástico, que viagem sensacional que esse artigo me fez passar. Sopranos é realmente a melhor coisa que eu assiti dentre Tv e cinema, ESPETACULAR!

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  5. Não assisti a série ainda mas sei que é um clássico da cultura pop. Meus irmãos adoram e eu talvez assista mesmo já sabendo o final que parece ser bem poético. Legal a sacada de não mostrarem Tony Soprano morrendo. Parabéns pelo post.

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  6. Não sei se é verídica mais eu vi uma entrevista em que o David Chase fala sobre o russo, quando perguntado sobre se o Christopher e o Paulie tinham realmente o matado, ele fala que nem tudo precisava ter uma resposta e que a que a morte dele dependia da imaginação da espectador. Eu acho que o mesmo vale com a questão da morte do Tony. Só lembrando que sobre o fim de Breaking Bad Vince Gilligan respondeu algo parecido em relação ao futuro do Jesse.
    Mas muito boa a análise, eu não percebido várias referências.
    Valeu mesmo

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  7. Que artigo completo, parabéns pelo trabalho! Adoro reviver Sopranos!

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  8. Obrigada pela ótima interpretação.

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  9. Olá! Li todo o material e você realmente merece os parabéns! Excelente trabalho! Eu assisti duas vezes a todos os episódios e não havia percebido grande parte dos detalhes que você comentou. Obrigado! Aproveitando que sua percepção vai muito além da minha, gostaria de saber se poderia comentar a questão da pintura que Paulie pede para refazer com o rosto de Tony. Para mim, as duas reações foram curiosas para mim, tanto a do Paulie, pedindo o retoque quanto a do Tony, que odiou o resultado final. Qual sua visão a respeito?

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  10. Gostei eu acabei de ver a série agora a pouco em 22 de Abril de 2018... eu fiquei confuso com o final eu tinha notado o assassino qd ele entrou na frente do AJ eu tava esperando ele voltar do banheiro e atirar no Tony mas terminou de um jeito inesperado mas agora entendi a visão dos criadores da série e é genial muito bom msm.

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  11. Gostei muito da sua analise, vou deixar aqui algo que me fez refletir após a leitura.

    No dialogo final entre T, Carmela e AJ.

    Carmela: Como foi no trabalho?
    AJ: Só sirvo café e transfiro ligações de Inge.
    Carmela: Sem perceber, você faz contatos.
    T: Você esta começando. Fique quieto.
    AJ: Certo. Pensar nos bons tempos.
    T: Não seja sarcástico.
    AJ: Você não me disse isso uma vez? - Pensar nos bons tempos?
    T: - Eu disse? Bem, é verdade, eu acho.


    O AJ fazendo o serviço básico seria a transição dele no mundo da mafia, acredito que ele buscaria por vingança.

    E a falha na memoria do T seria uma referencia ao Alzheimer que ele teve no "purgatório"?

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    1. Assumindo a frase sendo dita por ele, mesmo não lembrando, como se tivesse assumido a outra identidade.

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  12. Parabéns pelo post. Sem dúvidas foi uma jornada incrível assistir essa série, que não é sobre máfia, mas sim sobre como enxergamos nossas vidas e que rumo damos pra ela.

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  13. Melhor analise que vi ate agora.. parabnes

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  14. Acabei de terminar de assistir a série. E em seguida encontrei este post de vocês. Perfeito! Que bela análise, e que série maravilhosa.

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  15. Nossa que perfeito esse texto👏👏👏👏👏👏👏👏

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  16. Texto excepcional, terminei de ver a série essa semana e seu texto caiu como uma luva! Muito bom mesmo, parabéns, Sopranos sem duvidas é a melhor coisa que eu já assisti na minha vida, e eu tive sorte de mesmo muitos anos depois, eu consegui chegar no final sem spoliers!

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  17. É interessante notar que é Blundetto quem recebe Tony/Finnerty no casarão, no coma, insistindo em pegar sua maleta e dizendo que todos estavam a sua espera, talvez naquele momento Blundetto quisesse diminuir um pouco o sofrimento de Tony, até o matou para que não sofresse uma morte dolorosa nas mãos de Phill. Tony naquele momento purgaria alguns pecados mas talvez ainda poderia ser salvo, entretanto ao escolher não entrar no casarão e voltar à vida, desperdiça sua chance de ser um indivíduo melhor, aumentando seu karma de forma substancial.

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  18. Acabei de terminar a série, me pergunto como. Ao percebi Tanta coisa. Emocionada com cada detalhe ❤️ obrigada

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  19. Como uma série sobre mafiosos pode trazer reflexões tão profundas, filosóficas e existenciais? Genial! E a sua análise é incrível, aponta vários detalhes que passam despercebidos e indicam tanta coisa importante... ai sei lá pra mim isso que é cinema (arte televisiva). A forma de contar a história é mais foda que a história em si... simplesmente feliz de que exista conteúdos assim pra gente poder assistir e refletir. Assim como Sopranos, tem muita coisa boa por aí também só esperando pra gente ver/ ler.

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  20. Parabéns pelos artigos, especialmente por essa análise. Adorei. Terminando de assistir pela segunda vez agora. Série que merece ser reassistida diversas vezes na vida. Assistindo agora (2021/2021), após dez anos da primeira vez, foi maravilhoso rever com mais experiência de vida. Sim, tudo tem sentido e foi pensado nessa série. E o filme many saints também é top, retoma conceitos budistas tratados na série. Puta obra prima essa série que comecei a assistir apenas por ter o mesmo sobrenome (sim, meu sobrenome é Soprano, com orgulho).

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